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quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Emoção e dor nos versos de Auta de Souza

Eliane F.C.Lima

A escritora que invade este espaço é Auta de Souza. Era de Macaíba, RN, onde nasceu em 1876, tendo morrido em 1901, em Natal. A tuberculose, que surgiu aos 14 anos, levou-a muito cedo, como fez a muitos da geração ultrarromântica, com a qual seus textos são identificados. Conviveu, portanto, desde cedo com o sofrimento, acrescido das perdas de entes queridos, como os pais, um irmão e o namorado. Ao comentário de que, como grande parte dos escritos de mulher, a obra de Auta mostrou-se contagiada pelas experiências enfrentadas, deve-se argumentar que nisso não foi diferente de Casimiro de Abreu ou de Álvares de Azevedo. Aliás, em todos os períodos literários, a experiência da vida tem sido sempre o elemento propulsor da atividade artística e determinador do por onde se vai ou do como se vai. Toda obra artística se contamina de vida.
Publicou apenas um livro, Horto, que teve três edições. A primeira, 1900, teve prefácio de Olavo Bilac; a segunda, 1910, foi feita em Paris; a terceira, 1936, foi prefaciada por Alceu de Amoroso Lima. Sua poesia recebeu elogios da crítica e a adoração popular, de tal sorte que muitos de seus poemas foram musicados e cantados.

Num leque

Auta de Souza

Na gaze loura d'este leque adeja
Não sei que aroma místico e encantado...
Doce morena! Abençoado seja
O doce aroma de teu leque amado!

Quando o entreabres, a sorrir, na Igreja,
O templo inteiro fica embalsamado...
Até minh'alma carinhosa o beija,
Como a toalha de um altar sagrado.

E enquanto o aroma inebriante voa,
Unido aos hinos que, no coro, entoa
A voz de um órgão soluçando dores,

Só me parece que o choroso canto
Sobe da gaze de teu leque santo,
Cheio de luz e de perfume e flores!



Auta de Souza teve vários poemas a ela atribuídos depois de morta, tidos como psicografados por médiuns famosos, como Chico Xavier, por exemplo. A veracidade do fato não será debatida neste blogue. Mas, a partir do que testemunha o irmão Henrique Castriciano, em nota da terceira edição - "Nos últimos versos, nota-se a estranha serenidade espiritual a que chegou nos derradeiros dias, inspirando aos que a visitavam a mais religiosa veneração." -, resolvi confrontar dois poemas, o primeiro publicado em vida, de autoria comprovada, e o segundo, no livro Parnaso de além-túmulo, psicografia de Chico Xavier. É evidente o diálogo entre os dois textos. A quem visita este blogue cabe decidir se acredita ou não. É bom lembrar ainda que poetas transitam, corriqueiramente, entre vários mundos.


Ao pé do túmulo
 
Aos meus


Auta de Souza

Eis o descanso eterno, o doce abrigo
Das almas tristes e despedaçadas;
Eis o repouso, enfim; e o sono amigo
Já vem cerrar-me as pálpebras cansadas.


Amarguras da terra! eu me desligo
Para sempre de vós... Almas amadas
Que soluças por mim, eu vos bendigo,
Ó almas de minh’alma abençoadas.


Quando eu d’aqui me for, anjos da guarda,
Quando vier a morte que não tarda
Roubar-me a vida para nunca mais...


Em pranto escrevam sobre a minha lousa:
“Longe da mágoa, enfim, no céu repousa
Quem sofreu muito e quem amou demais”. 


Abaixo, enfim, o poema psicografado por Francisco Cândido Xavier. A titularidade foi atribuída por ele.


Hora extrema

Auta de Souza

Quando exalei meus últimos alentos
Nesse mundo de mágoas e de dores,
Senti meu ser fugindo aos amargores
Dos meus dias tristonhos, nevoentos.


A tortura dos últimos momentos
Era o fim dos meus sonhos promissores,
Do meu viver sem luz, sem paz, sem flores,
Que se extinguia em atros sofrimentos.

Senti, porém, minhalma sofredora
Mergulhada nas brisas de uma aurora,
Sem as sombras da dor e da agonia...

Então parti, serena e jubilosa,
Em demanda da estrada esplendorosa
Que nos conduz às plagas da harmonia!

Devo agradecer ao colaborador do Jornal de Poesia (clique aqui), Walter Cid, que mandou digitar toda a obra disponível da poetisa.


Um comentário:

Anônimo disse...

o que eu estava procurando, obrigado